ARTIGOSOPINIÃO

O enfraquecimento da recuperação judicial e a ascensão do turnaround para o soerguimento de empresas em crise

Por Murilo Mendes Latorre Soares (*)

Nos últimos anos, a recuperação judicial tem sido uma das ferramentas mais utilizadas por empresas em dificuldades financeiras no Brasil, permitindo-lhes reestruturar suas dívidas e evitar a falência.

No entanto, um aspecto interessante foi observado: o enfraquecimento da efetividade do instituto recuperação judicial e o crescimento do uso de outras estratégias de reestruturação empresarial, como o turnaround.

Esse movimento está diretamente relacionado às mudanças no cenário econômico, à complexidade dos processos judiciais e à busca por soluções mais rápidas e eficazes para a superação da crise empresarial. 

A recuperação judicial é um procedimento legal previsto na Lei 11.101/2005, cuja finalidade é permitir que empresas em crise financeira possam se reorganizar e continuar suas atividades, evitando a falência.

Para tanto, a empresa deverá apresentar um plano de recuperação, que será analisado pelos credores e homologado pelo juiz responsável.

Esse processo oferece uma série de benefícios, como a suspensão das ações de execução e a possibilidade de negociar dívidas de forma mais vantajosa. 

Apesar de ser uma ferramenta legal importante e que teve um aumento significativo nos últimos semestres, a recuperação judicial tem enfrentado uma série de dificuldades nos últimos anos.

O aumento da complexidade dos processos, a morosidade judicial, a falta de confiança nos resultados e as dificuldades na negociação com credores são contribuídas para o enfraquecimento da utilização desse instituto. Algumas das principais razões para isso incluem:

1. Excesso de burocracia e morosidade: o processo de recuperação judicial exige a aprovação do plano de recuperação por uma maioria dos credores e a homologação pelo juiz. Esse processo pode ser demorado e pode envolver uma quantidade excessiva de formalidades, o que gera incertezas quanto ao sucesso da recuperação.

2. Impossibilidade de cumprimento do plano de recuperação: em muitos casos, as empresas em crise não conseguem implementar os planos de recuperação judicial aprovados, o que resulta em um cenário de falência. Isso ocorre principalmente pela falta de um diagnóstico realista da situação da empresa e de um planejamento adequado.

3. A perda de credibilidade: muitos empresários e investidores perderam a confiança nos efeitos da recuperação judicial, especialmente quando a empresa apresenta um histórico de dificuldades financeiras prolongadas. A incapacidade de garantir um resultado eficaz levou a uma diminuição do uso dessa ferramenta.

turnaround como alternativa

Diante das dificuldades impostas pela recuperação judicial, muitas empresas têm buscado alternativas mais ágeis e práticas para superar a crise: o turnaround. O turnaround é uma estratégia de gestão empresarial definida para a recuperação de empresas em dificuldades financeiras, focada na análise detalhada da situação da empresa e na implementação de mudanças específicas no modelo de negócios, gestão e operações. 

Ao contrário da recuperação judicial, que depende de um processo judicial formal, o turnaround é uma abordagem mais flexível, baseada na capacidade da empresa de se reestruturar sem recorrer ao sistema judiciário. Esse modelo se baseia em uma série de ações práticas, como: 

1. Revisão da estrutura de custos: a redução de custos operacionais e a otimização da estrutura financeira são passos fundamentais para uma recuperação eficaz. Identificar áreas de desperdício e implementar mudanças para melhorar a eficiência é um primeiro passo crucial.

2. Reestruturação de dívidas: o turnaround também pode envolver a negociação direta com credores, de forma a estabelecer condições mais desenvolvidas para o pagamento das dívidas. Isso permite uma maior flexibilidade, sem a necessidade de recorrer ao longo e incerto processo de recuperação judicial.

3. Mudanças no modelo de negócios: uma análise crítica do modelo de negócios pode revelar a necessidade de diversificação de produtos, ajustes no portfólio de serviços e até mesmo mudanças estratégicas que permitiram à empresa se recuperar e voltar a crescer. 

A ascensão do turnaround como estratégia de recuperação empresarial pode ser atribuída a vários fatores.

No início, uma crise econômica global, agravada pela pandemia de COVID-19, trouxe uma série de desafios para as empresas, que passaram a buscar soluções mais rápidas e eficazes.

Em segundo lugar, a complexidade do ambiente regulatório brasileiro, caracterizada por altos custos tributários e uma burocracia judicial excessiva, tem levado os empresários a evitarem socorreram ao judiciário, preferindo buscar alternativas que ofereçam mais flexibilidade e controle sobre o processo de reestruturação. 

turnaround também ganhou destaque devido ao fato de ser um processo privado, onde o controle permanece nas mãos dos gestores da empresa, sem a intervenção direta do judiciário.

Isso possibilita uma maior agilidade na implementação de mudanças e, muitas vezes, resulta em uma recuperação mais rápida e eficiente.

Além disso, o turnaround permite uma abordagem mais personalizada para cada empresa, considerando suas características específicas, ou que não ocorra com uma recuperação judicial, que tende a ser mais padronizada. 

Embora a recuperação judicial continue sendo uma ferramenta importante no contexto empresarial brasileiro, o enfraquecimento na credibilidade desse instituto e o aumento da popularidade do turnaround refletem uma mudança significativa nas estratégias de gestão de empresas em crise.

turnaround oferece uma alternativa mais flexível, menos burocrática e, muitas vezes, mais eficaz para o soerguimento das empresas, permitindo-lhes superar a crise sem depender das complexidades e incertezas do processo judicial. 

Assim, empresários, investidores e gestores devem estar atentos a essa mudança de paradigma, considerando o turnaround como uma opção viável para a recuperação empresarial.

A regulamentação bem-sucedida de uma empresa depende da capacidade de adaptação e da implementação de estratégias assertivas, sejam elas dentro ou fora do âmbito judicial.


* Murilo Mendes Latorre Soares é advogado no Granito Boneli Advogados, especialista em Direito Processual Civil e bacharel em Direito pela PUC- Campinas

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