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Riscos jurídicos na comunicação: por que a revisão de textos é essencial para evitar processos e prejuízos

* Por Miriã Lira

A comunicação empresarial é, ao mesmo tempo, uma ferramenta estratégica e uma fonte recorrente de riscos jurídicos. Em um cenário em que marcas se comunicam constantemente por meio de anúncios, redes sociais, e-mails, rótulos, embalagens e campanhas institucionais, um único erro textual pode gerar consequências jurídicas relevantes.

Ambiguidade, promessa indevida, omissão de informação obrigatória ou uso inadequado de linguagem são fatores que, muitas vezes, passam despercebidos pelas equipes de criação, mas são suficientes para caracterizar infrações legais, gerar multas, ações judiciais e danos à reputação da empresa.

Nesse contexto, a revisão de textos deixa de ser uma etapa meramente estética ou gramatical e passa a exercer um papel essencial na prevenção de riscos jurídicos, pois se trata de uma prática que atua diretamente na segurança da comunicação e na proteção do negócio.

Este artigo aborda a relação entre linguagem, publicidade e responsabilidade jurídica, demonstrando por que a revisão de textos é uma ferramenta indispensável para empresas e departamentos jurídicos.

A comunicação como fonte de responsabilidade jurídica

Toda comunicação empresarial é um ato jurídico em potencial, visto que, ao divulgar uma informação, a empresa assume responsabilidades perante consumidores, órgãos reguladores e a sociedade como um todo.

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece princípios claros sobre transparência, informação adequada e vedação à publicidade enganosa ou abusiva. Além disso, normas específicas regulam setores como:

  • alimentos e bebidas;
  • cosméticos e produtos de higiene;
  • medicamentos e suplementos;
  • serviços financeiros;
  • mercado imobiliário;
  • publicidade infantil;
  • campanhas políticas e institucionais.

Portanto, em todos esses casos, a forma como o texto é redigido importa tanto quanto o conteúdo. Uma frase mal estruturada, um termo ambíguo ou a ausência de um aviso obrigatório podem configurar infração legal, mesmo sem intenção dolosa.

Publicidade enganosa e ambiguidade textual

Um dos principais riscos jurídicos na comunicação é a publicidade enganosa, que pode ocorrer tanto por ação quanto por omissão. 

Assim, nem sempre a infração está em uma “mentira” explícita. Em muitos casos, o problema reside em:

  • frases que induzem o consumidor ao erro;
  • promessas genéricas sem respaldo técnico;
  • uso de superlativos (“o melhor”, “o único”, “garantia total”) sem comprovação;
  • informações incompletas que alteram a percepção do consumidor;
  • linguagem confusa ou dúbia.

A ambiguidade textual é especialmente perigosa porque permite múltiplas interpretações. Aquilo que a empresa quis comunicar pode não ser o que o consumidor entendeu. E, juridicamente, prevalece a interpretação mais favorável ao consumidor.

Então, a revisão de textos atua justamente na identificação dessas ambiguidades, ajustando a linguagem para garantir clareza, precisão e segurança jurídica.

A importância da revisão como medida preventiva

Do ponto de vista jurídico, a revisão de textos funciona como uma medida preventiva de compliance comunicacional. Antes que a mensagem seja veiculada, a revisão analisa riscos que podem resultar em:

  • autuações administrativas;
  • multas aplicadas por órgãos reguladores;
  • ações judiciais individuais ou coletivas;
  • exigência de retratação pública;
  • recolhimento de materiais;
  • danos à imagem institucional.

Sabendo disso, ao revisar um texto é possível verificar, por exemplo:

  • se há informações obrigatórias que estão ausentes;
  • se os termos utilizados estão de acordo com a legislação aplicável ao segmento;
  • se o texto pode ser interpretado como promessa indevida;
  • se há incoerência entre texto e imagem;
  • se a linguagem está adequada ao público-alvo e ao contexto legal.

Essa atuação preventiva reduz significativamente o risco de passivos jurídicos decorrentes da comunicação.

Revisão de textos e legislação setorial

Alguns setores exigem atenção redobrada na comunicação, pois estão sujeitos a regulamentações específicas. Entre os exemplos mais comuns estão:

Produtos regulados pela Anvisa

Rótulos, embalagens e materiais publicitários devem seguir regras rigorosas quanto a alegações, advertências e informações obrigatórias. O uso de termos inadequados pode resultar em sanções administrativas.

Publicidade infantil

A legislação e os entendimentos jurisprudenciais são restritivos quanto à comunicação dirigida ao público infantil, exigindo cuidado extremo com linguagem, apelos emocionais e promessas.

Serviços de saúde e estética

Expressões que sugerem cura, garantia de resultado ou benefício comprovado sem respaldo técnico podem caracterizar infração jurídica.

Mercado imobiliário

Omissões ou imprecisões em anúncios podem gerar litígios relacionados a expectativa de entrega, características do imóvel ou condições contratuais.

Portanto, a revisão de textos para empresas, nesses casos, atua como um filtro técnico que auxilia na adequação da comunicação às exigências legais.

Erros comuns que geram riscos jurídicos

Na prática, alguns erros aparecem com frequência na comunicação empresarial:

  • uso de linguagem promocional exagerada;
  • ausência de disclaimers obrigatórios;
  • informações incompletas ou mal posicionadas no texto;
  • divergência entre texto publicitário e contrato;
  • traduções mal adaptadas;
  • inadequação do texto ao público-alvo;
  • falhas na padronização de termos técnicos.

Esses problemas, muitas vezes, não são percebidos pelas equipes internas, especialmente em ambientes de alta demanda e prazos curtos. Por isso, a revisão de textos atua como um olhar técnico externo, capaz de identificar riscos antes da publicação e/ou veiculação.

A relação entre departamentos jurídicos e revisão de textos

Embora departamentos jurídicos atuem na análise de contratos, termos e políticas, nem sempre acompanham de perto a produção de conteúdo publicitário e institucional.

A integração entre jurídico e revisão de textos permite:

  • alinhamento entre linguagem e exigências legais;
  • redução de consultas emergenciais após a publicação;
  • menor incidência de retrabalho;
  • maior segurança nas campanhas;
  • prevenção de crises jurídicas evitáveis.

Nesse sentido, a revisão não substitui a atuação jurídica, mas complementa o trabalho do departamento jurídico, atuando na base da comunicação.

Revisão de textos como investimento estratégico

Do ponto de vista empresarial, investir em revisão de textos é investir em:

  • segurança jurídica;
  • proteção da reputação;
  • clareza na comunicação;
  • conformidade regulatória;
  • redução de custos com retrabalho e litígios.

O custo de revisar um texto é significativamente menor que o custo de lidar com as consequências de um erro já publicado ou veiculado.

Empresas que adotam a revisão como parte do processo comunicacional demonstram maturidade institucional e comprometimento com boas práticas.

Conclusão

A comunicação empresarial não é neutra nem isenta de consequências jurídicas. Cada palavra publicada carrega potencial de impacto jurídico, especialmente em ambientes regulados e altamente competitivos.

A revisão de textos, nesse contexto, deve ser compreendida como uma ferramenta de prevenção de riscos, atuando antes que problemas se concretizem. Ao garantir clareza, precisão e adequação legal, a revisão contribui para a segurança jurídica e para a sustentabilidade do negócio.

Mais do que corrigir erros, revisar é proteger.


* Miriã Lira é revisora publicitária, especializada em análise de risco jurídico na comunicação, com atuação junto a agências e empresas na prevenção de passivos jurídicos decorrentes de textos publicitários e institucionais.

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